Por Rui Martins
O tablóide suíço dominical Sonntagsblick foi quem deu o furo, revelando a mudança de residência do presidente da FIFA, Gianni Infantino, de Zurique para Doha, no Catar. Imediatamente, em questão de segundos, toda a imprensa esportiva mundial, e também a não esportiva, publicava nos seus sites e dava destaque à informação.
Gianni Infantino, nascido no cantão suíço do Valais, assim como seu predecessor Sepp Blatter, já vive em Doha desde o mês de outubro. E as questões logo surgiram: por que Infantino precisa ficar mais de um ano no país sede da próxima Copa do Mundo, o que nunca aconteceu? Até agora, o presidente da FIFA costumava chegar uma semana antes de começarem os jogos. Para a inspeção da construção dos estádios e todos os controles de praxe existem funcionários competentes e especializados da entidade.
A notícia despertou os velhos demônios relacionados com a escolha de países sedes da Copa do Mundo, ligações do futebol com a política, corrupção e revelações sobre a maneira como foram construídos os estádios destinados à 22a. Copa do Mundo. E alguém vai se lembrar da viagem de Bolsonaro em novembro ao Catar, onde se encontrou com o presidente da FIFA (não se sabe se ficou sabendo da mudaça de Infantino) e com o emir, príncipe Tamim ben Hamad Al Thani, um dos homens mais ricos do mundo, com três esposas e doze filhos.
O ex-presidente da FIFA, Blatter, ao criticar a necessidade de seu sucessor ir viver no Catar, levantou a suspeita de haver nisso a vontade de tirar a sede da FIFA de Zurique, porém não para levá-la a Doha mas a Paris. Seria uma artimanha para enfraquecer Zurique e permitir o retorno da FIFA à capital francesa.
O jornal suíço Blick, comentando a nova residência do presidente da FIFA, lembrou ter havido muitas críticas há dez anos com a escolha da Copa do Mundo, e mesmo acusações de corrupção e de tráfico de influência. De acordo com as investigações feitas na época, houve suborno de funcionários da entidade.
Críticas também são feitas ao presidente da FIFA por manter relações amigáveis e próximas com o emir e com os dirigentes autoritários do Emirado. O Catar é um país muçulmano, na qual se observa a sharia. No governo do último emir, houve algumas mudanças, como o voto das mulheres, entretanto, em matéria de direitos humanos, o Catar vinha sendo denunciado por não conceder direitos aos trabalhadores imigrantes, justamente os responsáveis pela construção dos “estádios fantásticos” destinados à Copa.
As acusações incluíam maus tratos, trabalhos forçados e escravidão. O jornal inglês The Guardian cita um número de 6.500 mortes nessas construções, o que é desmentido pela FIFA. Essas denúncias de maus tratos foram também confirmadas pela Anistia Internacional. Os trabalhadores imigrantes não podem obter a cidadania catariana e nem seus filhos, mesmo se a mãe é catariana. A lei religiosa da sharia aplicada no país inclui a pena de morte e castigos corporais. Os trabalhadores estrangeiros e os turistas devem ser discretos caso pratiquem outras religiões.
De acordo com a sharia são proibidas e punidas as relações extraconjugais e os atos homossexuais estão sujeitos à pena de morte.
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Rui Martins é jornalista, escritor, ex-CBN e ex-Estadão, exilado durante a ditadura. Criador do primeiro movimento internacional dos emigrantes, Brasileirinhos Apátridas, que levou à recuperação da nacionalidade brasileira nata dos filhos dos emigrantes com a Emenda Constitucional 54/07. Escreveu “Dinheiro Sujo da Corrupção”, sobre as contas suíças de Maluf, e o primeiro livro sobre Roberto Carlos, “A Rebelião Romântica da Jovem Guarda”, em 1966. Vive na Suíça, correspondente do Expresso de Lisboa, Correio do Brasil e RFI.
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